Clair Obscur: Expedition 33 se destacou no mercado por méritos que vão muito além da sua estética deslumbrante ou da jogabilidade envolvente. O jogo, que ultrapassou a marca de 2 milhões de cópias vendidas mesmo estando disponível no Game Pass, conquistou o público com uma narrativa densa e personagens incrivelmente bem construídos. E entre todos, Verso se destaca como um dos protagonistas mais complexos e emocionalmente ressonantes da história dos videogames.
Um protagonista quebrado, mas humano
Verso não é o herói clássico. Ele não é nobre, nem puro, e muito menos moralmente correto. Seu comportamento é muitas vezes manipulador, silencioso, ardiloso. No entanto, é essa falha profundamente humana que o torna real. Verso é movido por dúvidas existenciais, insegurança e um desejo genuíno de se sentir vivo — mesmo que ele, na essência, não saiba se realmente existe.
Identidade fragmentada: quem é o verdadeiro Verso?
O personagem que acompanhamos durante Expedition 33 não é o Verso original. Ele é uma criação a partir de fragmentos da alma do verdadeiro Verso, morto em um incêndio ao salvar Alicia. O novo Verso carrega as memórias, vontades e afetos do original, mas luta o tempo todo com a sensação de ser uma cópia — uma imitação pálida.
Essa luta por identidade é o eixo emocional de sua jornada. Ele não se vê como um ser autêntico e acredita que seus sentimentos, por mais intensos que sejam, não são genuinamente seus. Isso o consome.
Amor, dor e o ciclo do sacrifício
Apesar de tudo, Verso ainda ama. Seu amor é contraditório, doloroso e, muitas vezes, distorcido — mas é real. Ele tenta proteger aqueles que ama, mesmo que isso exija escolhas moralmente questionáveis. Seu maior temor não é a morte, mas sim a prisão de uma vida que não sente como sua.
Ao longo da história, vemos esse conflito se intensificar. Ele forma vínculos, faz amigos, luta ao lado de companheiros — apenas para vê-los morrer ou desaparecer. Mesmo assim, ele continua. Porque, no fundo, ele acredita que pode fazer algo de bom com a vida que recebeu.

Entre dois mundos: o fardo da criação
Verso vive em um mundo pintado — uma realidade alternativa criada pela dor de sua mãe. Uma teoria recorrente entre os fãs sugere que, por conter parte da alma do original, Verso está preso nesse mundo contra sua vontade, sendo um elo metafísico que perpetua o ciclo de sofrimento.
Ele sabe que, se cumprir seu objetivo de destruir essa realidade, colocará fim a tudo: aos amigos que conheceu, às experiências que viveu, e ao próprio mundo em que existe. Mas ainda assim, ele está disposto a se sacrificar — assim como o original fez.
O confronto com Maelle e o dilema final
O clímax emocional do jogo envolve sua irmã de criação, Maelle. Cega pelo luto, ela se recusa a aceitar que aquele Verso é alguém diferente. Ela deseja reviver a vida que perdeu ao lado dele, mesmo que isso signifique aprisioná-lo em uma existência que ele nunca escolheu. Verso, então, precisa decidir: aceitar esse destino ou destruí-lo para libertar todos, inclusive a si mesmo.
Esse dilema moral — sacrificar todos os laços que construiu ou perpetuar uma realidade ilusória — é o ponto alto de sua jornada. Nenhuma escolha é fácil. Nenhuma é totalmente certa ou errada. E é exatamente isso que torna Expedition 33 tão impactante.
Um personagem que reflete o jogador
Verso não é só um protagonista. Ele é uma lente para refletirmos sobre identidade, memória, dor, e sobre o que define uma vida como real. Sua existência é marcada pelo luto de outros, pelo desejo de ser aceito e, acima de tudo, pela busca por liberdade emocional.
Mesmo sendo uma “criação”, ele escolhe sentir, amar e agir. Ele escolhe lutar, não por glória, mas por libertação — tanto dos outros quanto de si mesmo. No fim, sua dor não o define. Suas ações sim.
Verso não é um herói tradicional, mas é justamente por isso que ele se destaca. Sua complexidade emocional, sua luta interna constante e sua humanidade crua o tornam um dos protagonistas mais marcantes dos últimos anos nos videogames. Em um mundo de personagens rasos ou estereotipados, Verso é uma exceção — uma alma que, mesmo pintada, é real.