O declínio das protagonistas femininas marcantes nos games
Nos últimos anos, testemunhamos uma mudança estranha na representação das protagonistas femininas nos jogos. Enquanto outras mídias continuam entregando personagens complexas, cativantes e memoráveis, o universo dos games ocidentais parece ter perdido o brilho quando se trata de mulheres protagonistas com presença, charme e poder.
Quem não se lembra da comoção causada por Geralt em uma banheira em The Witcher 3? Aquela cena se tornou um marco. Mas quando uma personagem feminina é retratada como atraente, confiante e carismática, parece que estamos diante de um tabu. Em algum momento entre 2014 e hoje, personagens femininas “quentes” começaram a sumir dos jogos ocidentais. Aquelas mulheres com mistério, brilho nos lábios, e um olhar capaz de arruinar sua vida com uma única escolha de diálogo desapareceram do radar.
O novo estereótipo da protagonista “séria e sem graça”
As protagonistas femininas modernas tendem a ser sombrias, contidas, com histórias trágicas que raramente são exploradas de forma envolvente. Cabelos bagunçados, rostos sem maquiagem, cores opacas. Muitas carregam traços masculinos sem equilíbrio com a feminilidade — como se fosse proibido ser forte e bela ao mesmo tempo.
Não é que personagens introspectivas não funcionem, mas quando todas seguem o mesmo molde desinteressante, o impacto emocional simplesmente não acontece. Elas não se tornam ícones. Elas não inspiram. E o pior: são esquecidas logo após os créditos finais.

Ser feminina virou pecado?
Com medo de sexualização, muitos estúdios adotaram a postura de simplesmente apagar qualquer traço de charme, romance ou vulnerabilidade. Ela não pode sorrir demais, nem flertar, nem parecer vaidosa. E o resultado disso? Personagens que não soam humanas.
Quando temos a chance de criar uma personagem customizável — como em Baldur’s Gate 3 — o cenário muda. A Tav que criamos pode ser uma deusa carismática, que domina cada cena com sua aura magnética. Então por que os estúdios não conseguem entregar esse mesmo nível de carisma em protagonistas femininas pré-definidas?
As exceções que confirmam a regra
Existem, sim, personagens femininas marcantes na última década. Sadie Adler, de Red Dead Redemption 2, é o caos em cima de um cavalo. Tifa Lockhart, de Final Fantasy VII, combina força bruta com empatia. Max, de Life is Strange, é vulnerável, doce e poderosa à sua maneira. Nabooru, de Zelda, é um colosso de presença e elegância.
São personagens que nos marcam porque têm camadas, têm beleza, têm emoção — sem medo de ser femininas.
Oriente vs Ocidente: o contraste gritante
Enquanto os estúdios ocidentais parecem temer a feminilidade, os japoneses abraçam-na sem hesitar. A Capcom, por exemplo, continua entregando mulheres memoráveis em Resident Evil, como Jill, Ada, Claire e até Lady Dimitrescu, que virou referência de Halloween por anos.
A FromSoftware não fica atrás: The Doll e Lady Maria, de Bloodborne, ou Ranni e Melina, de Elden Ring, exalam magnetismo e poder silencioso. Não precisam de 80 cutscenes para nos cativar. Elas aparecem, deixam uma marca — e você nunca esquece.
Feminilidade não é fraqueza. É profundidade.
A questão não é escolher entre força e beleza. Personagens como Bayonetta, Lightning e Triss Merigold provam que uma mulher pode ser brilhante, complexa, sensual e ainda assim relevante para a narrativa. O problema não é a presença feminina — é a falta de coragem para explorá-la de forma completa.
O que queremos são personagens que sejam fortes e sensíveis, inteligentes e impulsivas, doces e perigosas. Personagens que provoquem emoções, que inspirem fanarts, cosplays, discussões. Mulheres que sejam lembradas não só por suas habilidades, mas pelo impacto que causam.